04.11

2008
5:00 am

Terrorismo poético, Pixobomb e o pelado na Bienal

Postado em Arte, Brasil

A partir desta terça, durante 13 dias um cara chamado Maurício Ianês se encarregará de uma inusitada performance na Bienal de São Paulo. Ianês ficará vagando nu pelo saguão do segundo andar e só fará uso de coisas que o público lhe der - incluindo comida, roupas, móveis e qualquer coisa que lhe entregarem, pelo que eu entendi.

Ou seja: se derem roupas para ele, ele veste. Se derem cama, ele dorme. Se derem comida, ele come. O trabalho se chama A Bondade de Estranhos e vai contar, hum, com a bondade de estranhos. Ianês é um artística plástico e sua performance, certamente, será considerada genial por muitos entusiastas da Bienal.

David Sedaris, humorista americano autor de Eu Falar Bonito um Dia, fez artes mas não poupa piadas direcionadas a esse tipo de artista plástico performático mala. Nesse livro, ele explica como toda a sorte de idéia idiota acaba sendo considerada revolucionária e de uma sensibilidade artística inigualável se sua carteira e seu nome permitirem.

Mas David, na época que era artista plástico e fazia essas performances esquisitas, também era duro. E não sei como ele não pensou nesse número, que além de alçá-lo à condição de gênio performático, ainda seria capaz de angariar umas boas dúzias de peças de roupas, teto e rango grátis por 13 dias.

Existe uma característica importante que o ser humano, especialmente o artista, deve cuidar para nunca perder - e ela se chama senso do ridículo. É perigoso quando você nem percebe mais que todo mundo está rindo de você enquanto você atua de maneira inteiramente séria. Claro que o meio termo é necessário, e ninguém precisa deixar de fazer nada preocupado com o que os outros vão pensar. Mas nenhum extremo é válido.

Não sei se isso é arte. Mas supondo que seja, por que a ‘manifestação’ do Rafael Pixobomb e do grupo de pichadores que invadiu primeiro a Belas Artes e depois a própria Bienal, aqui em cima, não é?

O que separa esse tipo de ação da ação dos outros caras? No caso do Pixobomb, ele diz que as invasões são um manifesto contra a capitalização do grafitti, que foi concebido como uma arte ilegal. Ianês, segundo o UOL, pretende com sua instalação “questionar a comunicação entre artista e público, e a responsabilidade do trabalho nesta comunicação.” Oi? É triste, mas a justificativa dos pichadores é muito mais coerente e bem menos hermética.

E a pichações, ou a maneira como elas aconteceram, ainda têm origem num um cara chamado Hakim Bey, que prega o terrorismo poético, cujo conceito é difícil de definir, mas tem seu maior expoente hoje em dia num cara que tá super famoso: o Banksy. Terrorismo poético envolve intervenções urbanas, arte de guerrilha, e é uma maneira ligeiramente invasiva de inserir arte e protesto no contexto urbano, no dia-a-dia, em situações em que não se espera que haja arte e contestação.

Crianças jurando bandeira à rede de lojas Tesco, por Banksy

E aí? Qual dos dois é mais arte, qual dos dois é mais questionador? O pelado que quer contestar a relação entre arte e o público (ou seja, até existe uma relação com o terrorismo poético, que também questiona e subverte essa relação) e é aclamado por isso ou o bando de pichadores, que invade uma galeria de artistas engomadinhos para pichar uma parede vazia e com isso contestar o que é estabelecido como arte?

*Colaborou Nina Ramos (com a discussão)

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17 comentários (Comente! Trackback)

  1. Paulo Henrique
    04/11/08 | 10:34 am | #

    O problema da arte de pixadores é usar de paredes que não lhes pertencem…

    Responder

    Daniel Reply:

    não lhes pertence no seu ponto de vista…

    Responder

    Paulo Henrique Reply:

    A regra é bem simples. Se eu pago IPTU de um muro, ele pertence a mim. E se eu quero meu muro verde limão limpo, NINGUÉM tem o direito de ir lá e desenhar algo nele.
    Quanto a obras públicas, elas pertencem de alguma forma a todo mundo. Porém que fiquem mantidas da forma como foram expostas. Se você não gosta de uma estátua de 7 metros de altura no meio da Santo Amaro, não é motivo suficiente para você pixá-la.
    Gostaria de saber o ponto de vista dos pixadores para alegarem que o muro da minha casa ou a ponte da marginal pertence a eles e, portanto, podem ser livremente emporcalhadas com sua arte estúpida.

    Responder

  1. Ivan
    04/11/08 | 11:15 am | #

    Provavelmente os pichadores não tinham hora marcada para sua exposição…

    Responder

  1. Andre Roquentin
    04/11/08 | 11:43 am | #

    OLá!

    Pixação é arte??… na verdade, notemos ao menos uma coisa: os moleques chamam atenção pro ataque ao convencionalismo. O figura peladão é absolutamente patético. Os garotos vandalizam a propriedade privada, conceitos estabelecidos pela sociedade, naquela de “arte como crime crime como arte”. Pra mim, parece mesmo expressão de um mundo que não se acerta esteticamente. Parece que só resta meios de provocação, nada mais, um dadaísmo pós-moderno, da era do vazio.Mas o mais interessante não é indagar se pixação é arte, e sim o valor dos gestos de vandalismo.

    Agora, o peladão é brincadeira…

    Beijos Ana Vedder!

    Responder

  1. Nathália
    04/11/08 | 12:43 pm | #

    É assustador viver em uma época em que um cara peladão aguardando a bondade dos outros no meio de uma exposição é considerado arte. Mas, cá pra nós, todo mundo hoje quer os seus quinze minutinhos de fama, e tem gente que vai aos extremos para tal.

    Nesse contexto, se tivesse que escolher lados, ficaria com os pichadores, que pelo menos sabem articular o porquê de tal ato (ridículo).

    Esse mundo tá de cabeça pra baixo mesmo!

    Ana, adorei seu blog, vou linká-lo no meu e passarei mais vezes! Beijos!

    Responder

    Ana Freitas Reply:

    Nathalia, adorei o seu tbm! Conteudo e forma. =)

    O Andre, aqui em cima, criticou a contestação pela contestação, que acontece nos dois casos, mas ainda assim a ação dos moleques me parece mais interessante do que a do pelado.

    Queria a opinião de um estudioso, ou de alguém envolvido no meio, pra dar uma equilibrada..

    Responder

  1. Ana Freitas
    04/11/08 | 1:47 pm | #

    O que é mais arte - andar pelado na Bienal ou invadir e pichar parede em branco? Discuta no meu bloguxo, amigues http://tinyurl.com/5cxxa8

  1. Rubens
    04/11/08 | 1:48 pm | #

    Essa inhaca toda me fez lembrar de um imbecil se dizendo artista que deixou um cachorro amarrado morrendo de fome e sede por vários dias, até que o cachorro morreu. E ainda consideram esse tipo de anormalidade como Arte.
    Na próxima bienal vou vazer cocô em garrafas de vinho do porto e expor também. Quem sabe não me torno o próximo Da Vinci.

    Responder

  1. marcus
    04/11/08 | 3:53 pm | #

    Estivesse eu em São Paulo, entregaria um vibrador pra ele.

    Responder

  1. Global Voices Online » Brazil: The “Empty Biennial” fills up the blogosphere
    09/11/08 | 5:05 pm | #

    [...] walls with phrases like: “This is what art is”, and their tags, Susto, 4 and Segredo. Ana Paula Freitas [pt] is not sure if she believes Mauricio Ianês' performance is art, but in case it is, what [...]

  1. Global Voices em Português » Brazil: A “Bienal do Vazio” enche a blogosfera
    09/11/08 | 5:15 pm | #

    [...] as paredes com frases do tipo: “Isso que é arte”, além de suas tags Susto, 4 e Secretos. Ana Paula Freitas não tem certeza se ela acha que a instalação de Mauricio Ianês é arte, mas caso seja, o que [...]

  1. eduardo
    26/11/08 | 7:03 pm | #

    O problema geral num é nem um nem outro, mas sim o pessoal falar de coisa que num sabe. Esse é o principal problema… Podem culpar os artistas modernos que romperam com essa necessidade de estetização da arte ou qualquer coisa que o valha, mas a ignorância (aqui entendida não no sentido pejorativo, mas apenas no sentido de ignorar, não saber, não entender sobre determinado assunto) é o verdadeiro buraco a ser transposto. Se o público não acompanhou o caminhar da arte, a culpa não é dela…

    Responder

  1. eduardo
    27/11/08 | 1:39 pm | #

    Minha opinião quanto ao “peladão” é favorável à obra do artista. Porque? Penso eu porque ele simplesmente explicita a hipocrisia dos visitantes que lhe dão coisas. Em que sentido? No sentido de ser extremamente provável que eles num dêem nada a algum pedinte de rua, mas a um pedinte de galeria sim. Percebe a sutileza do ato dele? “Da bondade de estranhos” é algo também ligado ao tema “em vivo contato” da bienal (tema tão pouco levado em consideração por aqueles que falam da bienal… infelizmente, pois é um ponto de esclarecimento chave tanto da exposição quanto de diversas obras), já que o artista trabalha diretamente com o público, sem intermediário, interagindo no momento com o público, e as reações das pessoas por não haver um intermediário entre elas e o artista (que poderia ser um objeto de arte) são bastante interessantes. Esse caso da hipocrisia é um deles. porque num deixar o cara pasando fome? porque ele é descente, ele é um artista, ele tá na bienal… E no caso do morador de rua? bom… ele pode nos roubar… Enfim. Esse é apenas um dos aspectos que pode ser lido nessa obra.
    E já que no post foi contraposta com a pixação do pessualzinho do pixabomb, podemos fazer aqui um paralelo também quanto a esse assunto. De certo que os pixadores não são um público desejável no interior de uma galeria ou bienal, mesmo que esse tipo de expressão artística esteja tomando corpo há algum tempo. O grafitte é admitido, mas o pixar?
    Eu pessoalmente rechaço qualquer possibilidade de dar algum crédito a eles, pois suas intenções não me parecem artisticas. Me parecem midiáticas. Fora o que aconteceu na Belas Artes, ou na outra galeria. Enfim, são um bando de moleques que ainda não amadureceram sua forma artístca, e conseguem seus 15 minutos invadindo lugares privados (mesmo que aparentemente publicos) e causando danos a todos (imagina o dinheiro gasto no segundo andar do pavilhao para ser restaurado?)

    Responder

  1. On The Road Again - arte de sucata e um FAIL aerodinâmico | Olhômetro
    02/12/08 | 9:39 pm | #

    [...] eu também não entendi, mas aí a gente entra naquela discussão do que é arte, [...]

  1. Ian
    13/12/08 | 12:06 am | #

    Bla bla bla bla um monte de pseudo-intelectuais vomitando retórica pra justificar qualquer patifaria. Essa “intervenção” não tem qualquer base qualque logica ou função. É lixo assim como o intelecto desse imbecil chamado Pixobomb. Confundem depredação de patrimonio com arte, seguindo essa logica Fernandinho Beira Mar é artista. É muito simples é só ele declarar que suas ações são intervenções artisticas.. qual a diferença pra esse moleque ? Que alias esconde sua falta de capacidade artistica e intelectual sob o manto da anarquia !!!!Por seguir esse caminho e dar ouvidos e espaço a esses marginais é que a Bienal faliu e continuara falida. Pixação não é arte não é interveção, não é NADA, é crime e merece cadeia ponto. Nada alem disso. Tudo que for dito alem é retórica de artista frustrado !!!
    Porque senão daqui a pouco quando a policia pegar e der uma surra nesse marginal, deveria ser gravado expor isso na bienal como interveção artistica !!! ou não ?

    Responder

    Yuri Reply:

    Ian,

    Sinceramente, o tom raivoso do post já dispensa respostas, mas o seu caráter ideológico não poderia sentar aí berrando sem ter uma resposta.

    Em primeiro lugar, gostaria de refutar esse tom virulento. Quando se está argumentando, se fala com respeito. Não chame ninguém de frustrado ou chame coisas de patifaria. Note que a autora tem opinião,
    mas tem a decência de questionar e se questionar, o que revela um mínimo de responsabilidade (alô, Ana! Quanto tempo! =P).

    Em segundo lugar, tamanha virulência contra ataque à propriedade privada que NÃO é sua é claramente ideológica. E como eu estou no campo diametralmente oposto à essa ideologia, gostaria falar sobre isso.

    Como foi dito por um camaradinha ali em cima, a pichação é uma forma de agredir um conceito socialmente concebido e implantado (por pessoas que não nós), questionar esse conceito de forma chocante. Certamente, o Pixabomb ia rir da sua cara se lesse você com sua raivinha. Portanto, só por quê quebra um conceito arcaico, não pode ser desqualificada enquanto arte. Quantas vezes tantos grandes artistas não chocaram antes? Não gritaram, xingaram, pintaram pessoas nuas ou fazendo sexo, tantas coisas antes? A propriedade privada é mais sagrada que o sacro pudor cristão?

    Eu concordo com a arte “criminosa”. Aliás, essa mania de chamar de criminoso o que a lei diz que é criminoso tá fora de moda. Ou vai dizer que você não baixa música? Não ouve CD pirata? Nunca deu dedo ou xingou alguém (é crime! Eu vi a lei!)?

    Aquilo que subverte leis que não se adequam mais à realidade certamente merece um pouco de respeito, e não é demérito cometer isso.

    Já é impensável, hoje, termos tanto dinheiro, esforço e tudo o mais empregado em tantas coisas e tão pouco empregado em resolver problemas sociais concretos. E as pessoas responsáveis por isso partilham da sua opinião.

    Comparar um pichador à Fernandinho Beira-Mar é uma ótima piada. Comparar um rato, que rói o queijo estragado que você come e acha uma delícia, com um leão que come seu braço, é engraçado por hipérbole.

    Terceiro, não sou anarquista, mas vale ressaltar que “o manto da anarquia” e seus perigos é desculpa para totalitarismos, assim como os “terroristas”, e cheguei a me sentir agredido pelo uso da expressão como se você fosse um general da reserva que torturou “terroristas”. (Você é?)

    Quarto, “tudo o que for dito lém é retórica de artista frustrado”? É assim que você encontra o argumento irrefutável? Desqualificando quem venha a discutir? Argumente de verdade, amigo… Pelo menos você é engraçado.

    Quinto, comparar violência policial, quando um oficial com cara de maluco te dá uma surra, com a pichação, novamente, não tem cabimento. Na certa você nunca tomou uma dura violenta da polícia pra estar fazendo a piadinha. Eu já vi policial colocando dedo na cara e apontando fuzil pra uma passageira pacata de ônibus. E tenho noção de que isso foi pouquíssimo em relação ao que fazem.

    Sexto, você chamou o rapaz de muitos nomes. Quero ver ele entrar com um processo na justiça e te fazer ficar de 3 a 6 meses detido/pagar fiança. Aí veríamos como você ia ter moral pra chamar alguém de marginal.

    Bom, é isso que eu queria expor aqui. Acho legal não falar em absolutos. Essa é minha opinião e não chamei ninguém de patife ou bandido pra expressá-la, e viram como não ficou mal?

    Desculpa pela resposta longa.

    Responder

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