A partir desta terça, durante 13 dias um cara chamado Maurício Ianês se encarregará de uma inusitada performance na Bienal de São Paulo. Ianês ficará vagando nu pelo saguão do segundo andar e só fará uso de coisas que o público lhe der - incluindo comida, roupas, móveis e qualquer coisa que lhe entregarem, pelo que eu entendi.
Ou seja: se derem roupas para ele, ele veste. Se derem cama, ele dorme. Se derem comida, ele come. O trabalho se chama A Bondade de Estranhos e vai contar, hum, com a bondade de estranhos. Ianês é um artística plástico e sua performance, certamente, será considerada genial por muitos entusiastas da Bienal.
David Sedaris, humorista americano autor de Eu Falar Bonito um Dia, fez artes mas não poupa piadas direcionadas a esse tipo de artista plástico performático mala. Nesse livro, ele explica como toda a sorte de idéia idiota acaba sendo considerada revolucionária e de uma sensibilidade artística inigualável se sua carteira e seu nome permitirem.
Mas David, na época que era artista plástico e fazia essas performances esquisitas, também era duro. E não sei como ele não pensou nesse número, que além de alçá-lo à condição de gênio performático, ainda seria capaz de angariar umas boas dúzias de peças de roupas, teto e rango grátis por 13 dias.
Existe uma característica importante que o ser humano, especialmente o artista, deve cuidar para nunca perder - e ela se chama senso do ridículo. É perigoso quando você nem percebe mais que todo mundo está rindo de você enquanto você atua de maneira inteiramente séria. Claro que o meio termo é necessário, e ninguém precisa deixar de fazer nada preocupado com o que os outros vão pensar. Mas nenhum extremo é válido.
Não sei se isso é arte. Mas supondo que seja, por que a ‘manifestação’ do Rafael Pixobomb e do grupo de pichadores que invadiu primeiro a Belas Artes e depois a própria Bienal, aqui em cima, não é?
O que separa esse tipo de ação da ação dos outros caras? No caso do Pixobomb, ele diz que as invasões são um manifesto contra a capitalização do grafitti, que foi concebido como uma arte ilegal. Ianês, segundo o UOL, pretende com sua instalação “questionar a comunicação entre artista e público, e a responsabilidade do trabalho nesta comunicação.” Oi? É triste, mas a justificativa dos pichadores é muito mais coerente e bem menos hermética.
E a pichações, ou a maneira como elas aconteceram, ainda têm origem num um cara chamado Hakim Bey, que prega o terrorismo poético, cujo conceito é difícil de definir, mas tem seu maior expoente hoje em dia num cara que tá super famoso: o Banksy. Terrorismo poético envolve intervenções urbanas, arte de guerrilha, e é uma maneira ligeiramente invasiva de inserir arte e protesto no contexto urbano, no dia-a-dia, em situações em que não se espera que haja arte e contestação.
Crianças jurando bandeira à rede de lojas Tesco, por Banksy
E aí? Qual dos dois é mais arte, qual dos dois é mais questionador? O pelado que quer contestar a relação entre arte e o público (ou seja, até existe uma relação com o terrorismo poético, que também questiona e subverte essa relação) e é aclamado por isso ou o bando de pichadores, que invade uma galeria de artistas engomadinhos para pichar uma parede vazia e com isso contestar o que é estabelecido como arte?
*Colaborou Nina Ramos (com a discussão)
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Tags: Arte, arte urbana, banksy, bienal, hakim bey, mauricio ianes, nu, performance, pixobomb, terrorismo poético
Daniel Reply:
December 31st, 2009 at 1:28 am
não lhes pertence no seu ponto de vista…
Responder
Paulo Henrique Reply:
January 4th, 2010 at 2:00 am
A regra é bem simples. Se eu pago IPTU de um muro, ele pertence a mim. E se eu quero meu muro verde limão limpo, NINGUÉM tem o direito de ir lá e desenhar algo nele.
Quanto a obras públicas, elas pertencem de alguma forma a todo mundo. Porém que fiquem mantidas da forma como foram expostas. Se você não gosta de uma estátua de 7 metros de altura no meio da Santo Amaro, não é motivo suficiente para você pixá-la.
Gostaria de saber o ponto de vista dos pixadores para alegarem que o muro da minha casa ou a ponte da marginal pertence a eles e, portanto, podem ser livremente emporcalhadas com sua arte estúpida.
Responder