Daí você tá todo sossegado lá na fila do quilinho.
Quilinho é o bandejão restaurante self-service de sua preferência
Pegou o pratinho, seus talheres e está preparado para a fase inicial da maratona, que consiste geralmente em selecionar as saladas que mais lhe apetecem e começar o preenchimento do seu prato.
Só que tem pessoas no mundo, e elas não são raras viu - podem ser eu ou você - que são indecisas naturalmente. E essa natureza que manifesta confusão diante de tantas opções dá as casas também na fila do self-service.
Você já entendeu de quem eu tô falando. São aquelas pessoas que vão pegar, digamos, uma porção média de arroz, mas que por algum motivo não fazem isso com uma ou duas investidas contra aquele bagulho de alumínio. São aqueles sujeitos que, para construir a porção almejada de arroz no prato, enchem a escumadeira 6 vezes com pequenos montinhos, até que estejam satisfeitas com a quantidade avançada.
Acho que eu gostaria de mais oito grãos. (…) Não. Talvez 12. É, 12 vão me satisfazer, com toda certeza.
Se pudesse dizer algo pra essas pessoas, diria pra que elas enchessem a escumadeira com o alimento-alvo, observassem na própria escumadeira se a quantidade está de seu agrado e então colocassem a comidinha no prato. Caso a estimativa de quantidade parecesse menor do que o objetivo inicial, daí bastaria pegar o que faltava e colocar no prato.
Mas eu não posso e nem quero dizer, porque como destaquei no começo, ‘você tá lá sossegado na fila do quilinho’. Então não há motivo para se preocupar com essas pessoas. Basta esperar e pegar sua comida, porque na maioria das vezes vai sobrar pra você.
CONTUDO, os próprios indivíduos indecisos se sentem incomodados socialmente por estarem fazendo a fila do self-service dobrar a esquina, sendo que ele tá parado no arroz, que é um negócio que todo mundo vai pegar, então não pode passar na frente. Por mais que ninguém fale nada, ou bufe, ou olhe torto, o cara vai se sentir mal quando enfiar a colher lá no arroz pela quarta vez. Então ele se justifica - sem que alguém tenha solicitado.
Elas vão te olhar com um sorrisinho simpático e vão exclamar, amistosas - “ai, é tanta coisa que a gente não sabe o que escolher, né?” ou “nossa, essa escumadeira não é prática, fica caindo tudo da colher, aí a gente precisa pegar de novo, que inconveniente!”
(Existe outra técnica, que consiste em enrolar perguntando pra pessoa de trás se ela sabe o que é aquele empanado que parece peixe mas que, até onde a gente bem entende sobre carnes, pode ser frango. Ou porco. Mesmo quando tem uma plaquinha verde limão na frente da comida indicando do que se trata. Mas daí a pessoa é de outro tipo, não entra na categoria - embora a estratégia funcione e seja até socialmente mais aceita)
A fila do self-service é um dos lugares mais fáceis de encontrar um gênero social que eu chamo de pessoas que dão satisfação sem que você tenha pedido que elas fizessem isso. Elas estão por aí: na sua casa, no seu trabalho, na fila do banco, na chuva, na casinha de sapê. E quando você menos esperar, elas vão te dar satisfação sobre algo que você realmente não deseja saber.
Essa característica, como no caso dos enroladores de fila de self-service, muitas vezes advém da consciência pesada. O cara se sente culpado por estar causando um problema e então desanda a falar pra ver se justifica. Mas a situação toda piora. Porque:
1. se você está realmente puto com o sujeito, vai dar um sorriso amarelo e continuar puto com a desculpinha;
2. se você tá sossegado esperando ele, vai dar um sorriso amarelo e de repente vai se tocar que ele tava enrolando, daí vai ficar puto com a desculpinha.
Ou seja, dar satisfação sem que alguém te peça satisfações nunca é bom, de um jeito ou de outro. Não funciona quando você sai da fila do banco pra ir perguntar um negócio pro caixa, volta e sem que te perguntem nada explica pras pessoas de trás que já estava ali desde as 10h e que o senhor de bigode atrás de você viu você saindo e tudo. Não funciona quando você chega em casa depois do horário e sua mulher nem te pergunta nada mas você já desanda a tagarelar sobre reuniões do trabalho e um chefe chato e careca. Não tente.
AINDA ASSIM é um comportamente interessantíssimo, até divertido de observar. Comece a reparar nas pessoas que têm necessidade de se explicar sem que alguém tenha pedido explicações - sua linguagem corporal, o tom de voz, os recursos amistosos (como uma risadinha, um papinho casual) e você verá que o mundo e o comportamente humano se tornará muito mais divertido.
Mal posso esperar por um programa no Discovery Channel que, com uma câmera escondida de alta-precisão instalada no ventilador do restaurante, capte com minúcia o modus-operandi e o comportamento peculiar desse gênero tão comum na nossa espécie. Eu assistiria.
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Tags: comida, como fazer amigos e influenciar pessoas, comportamento, crônicas, restaurante
Ana Freitas Reply:
July 17th, 2009 at 2:49 pm
HAHAHAHAHA
Cara, eu NESSE SEGUNDO voltei do médico. Marquei há três semanas pras 11h15. É em frente da minha casa. Sai de casa 11h10, entrei no consultório, deixei minha carteirinha e RG com a moça. Eram 15 pra meio-dia e ela não tinha me chamado ainda nem pra FAZER A FICHA.
Me levantei, fui até ela e disse: “Eu vou ser atendida até o meio-dia?”
Eu não perguntei quanto tempo demoraria, porque suspeitei que ela não poderia me dizer. Essas pessoas são lesadas, vc precisa facilitar pra elas, dar uma pergunta cuja resposta seja SIM ou NÃO simplesmente.
Mas a mulher conseguiu. “Ahhnn… hum… tem… quatro pessoas na sua frente”.
Porra. O mínimo que ela tem que dizer é “NÃO senhora, não vai”. ÓBVIO que nao, a não ser que a médica seja MUITO RUIM.
E eu caminho feliz pra fora do consultório sabe? Simples.
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