Se você viu inteiro numa boa, sem se constranger, provavelmente o texto a seguir é pra você.
De fato, várias coisas nesse vídeo não fazem sentido. A primeira é que 100 reais só é migalha pra gente como eu e você, mas provavelmente não é para quem vive com 400 reais por mês. É tipo um aumento gigante na renda. Não vou entrar em méritos partidários - só digo que, nos países de primeiro mundo, todo mundo acha lindo que o governo dê pensão pras pessoas que não trabalham (é, isso rola). “Olha só que lindo nos países desenvolvidos, lá se o jovem não quiser trabalhar, ele pode viver de pensão”. Aqui, é assistencialismo, é dar dinheiro pra vagabundo que não quer trabalhar (reaça tem essa coisa maravilhosa de achar que no Brasil ninguém gosta de trabalhar, só ele, que geralmente nem trabalha).
A segunda coisa que não faz nenhum sentido é esse clipe dessa música horrível no final é que ele só ajuda a alimentar o espírito babaca de falar que nenhum político presta. Porque o tipo de pessoa que repete isso não percebe que repetir isso é só uma maneira de tirar de si a responsabilidade de achar um que preste (é, é incrível, mas tem gente boa na política). As pessoas que bradam que nenhum político presta não sabem em quem vão votar, não querem saber e também não se lembram em quem votaram na última eleição.
É uma maneira muito eficaz de perpretar justamente o que o vídeo crítica, também, dizer que ‘é só a educação que salva esse país, talvez em duas ou três gerações’. Primeiro, porque é o óbvio do óbvio, mas aqui não tem a intenção de ser óbvio, mas de tirar do ombro da minha e da sua geração a responsabilidade de fazer alguma coisa. E é uma responsabilidade nossa, queira você, o Felipe Neto, eu, ou não.
Também não faz sentido que o autor do vídeo mande as pessoas estudarem quando ele fala “dos quatro candidatos…”, “tem alguém aí que vai mudar o Brasil?..”, “as pessoas só votam em quem vai ajudar a classe social delas” e tal. Primeiro porque há bem mais que quatro candidatos à presidência; segundo, que por acaso as propostas de um cara chamado Plínio Arruda, só pra citar um dos quatro grandes, pra bem ou pra mal, mudariam sim E MUITO o país (apesar de que ‘mudar o país’ é uma expressão bisonha. Felizmente, na democracia em que vivemos, nenhuma instituição política tem poder o suficiente pra fazer algo nos termos de MUDAR O PAÍS. Felizmente, há várias instâncias de poder, oposição, e isso equilibra muito a disputa de interesses, o que impede coisas do tipo MUDAR O PAÍS, seja lá o que isso for); terceiro que sim, as pessoas só votam em quem vai ajudar a classe social delas porque… é isso que o voto é. A gente vota em quem acredita que vai melhorar a nossa vida.
Uma coisa que me preocupa de verdade é ver esse bando de gente rica (como eu, é verdade; sou rica) reclamando que o país tá uma merda. AMIGO: você estudou em escola pública? É, eu também não. Você vive com dinheiro suficiente pra precisar de 100 reais a mais por mês? É, eu também não preciso. Sua vida piorou nos últimos 16 anos? Eu acho que não, heim. A minha, pelo menos, melhorou bastante. A da Luzinete, que trabalhou aqui em casa, também. E de todo mundo que é bem mais pobre que eu que eu vejo no trem… pelo menos eles parecem ter uns celulares legais.
Claro que há problemas, eu não tenho dúvida disso. A educação pública é sim péssima, falta transporte público, falta saúde. Mas a diferença entre o meu discurso e o seu é que eu tento me sentir responsável por esses problemas. Eu não ponho a culpa nos políticos (que eu escolho).
Discursos como esse do Felipe são o câncer. São eles que fazem as pessoas se sentirem ok por serem alienadas politicamente, burras, porque tira a culpa delas. SE VOCÊ NÃO SE INTERESSA POR POLÍTICA (e você tem acesso a internet e está vendo o vídeo do Felipe Neto no YouTube) a culpa é 100% SUA. LIDE COM ISSO. Não jogue a responsabilidade na falta de educação pública, em ‘políticos picaretas’, no que for.
*O Felipe é um amigo da internet, que inclusive me pediu opinião sobre o roteiro desse vídeo depois de tê-lo feito. Eu disse pra ele que não concordava, discutimos um pouco sobre política, foi legal. Quando o vídeo saiu e eu vi um monte de gente replicando a posição dele (que eu considero prejudicial pro estado das coisas), resolvi escrever uma resposta. É só pra evitar que muita gente repita o que o Felipe tá dizendo sem sequer contestar; eu tenho certeza que esse tipo de comportamento, de replicar 100% o que outra pessoa diz, é algo com o que ele também não concorda. Lembre-se SEMPRE do MANUAL DA DESCONFIANÇA PRÁTICA. Ele vem a calhar nessas horas. Desconfie de tudo. E sim, isso inclui esse texto.
**Se para você, votar no Tiririca é ‘protesto’ (caramba heim, quanta rebeldia), saiba que você não apenas é um idiota, como está sendo feito de idiota. Confira aqui o Risco do Fator Tiririca.
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Tags: alienação, desconfiança, dúvida, Política, vídeos
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