Esse texto foi postado originalmente no 3meia5.
A minha sina é esse negócio de viver em lugares que as pessoas consideram de menor importância. Como Santo André, ninguém sabe nada sobre o Panamá - bem como Santo André, onde eu morava antes de vir pra cá, as pessoas têm ideias completamente equivocadas do que esse lugar pode ser.
Palavras-chave sobre o Panama na cabeça do brasileiro de classe média minimamente bem informado:
- Canal do Panamá
- ET do Panamá
- América Central
A maioria nem sequer tem certeza de que a língua falada aqui é o Espanhol, não faz ideia que a moeda corrente é o dólar norte-americano e que aqui se vive de maneira muito parecida com o Brasil, com diferenças peculiares, algumas que nem sequer caberão aqui. De todo modo, nos isenta de reclamar que os americanos não saibam que falamos português, ou que nossa capital é Brasília, quando nada sabemos sobre um país tão próximo da gente, geograficamente e em outros aspectos.
O meu dia no Panamá começou como todos os dias no Panamá começam: quente e com barulho de construção civil. Aqui em El Cangrejo, o bairro em que eu moro, a especulação imobiliária está a toda. Tem um prédio residencial grande sendo construído a uns 50 metros do meu, os operários botam a mão na massa a partir das 6h30 da manhã e, com eles e com o sol quente, eu pulo da cama. Acontece que o Panamá não foi tão legal comigo desde que cheguei e eu venho me sentindo meio doente. Tive que tomar a chata e dispendiosa decisão de ir, pela segunda vez, a um hospital panamenho.
O Punta Pacífica Hospital cobra até pela medição de sinais vitais que, eu juro, foi feita por uma máquina e, também juro, estavam bem evidentes, já que eu cheguei lá andando e falando. Cobram as seringas, o oxigênio usado nas três inalações, as agulhas, o lençol que eu usei pra me cobrir naquele ar condicionado de 14 graus… tudo. Na verdade, essa observação é isenta de julgamento, porque dá pra entender que se cobre por tudo, mesmo - o hospital é realmente excelente, de atendimento excepcional. E afinal, três inalações depois, o médico hispanofalante de dicção exemplar para um panamenho (sei lá se ele era panamenho - nesse lugar, tem gente do mundo inteiro) explicou que segundo o exame de sangue e a chapa eu não tinha infecção nenhuma, e as profundas dores para respirar, que cessaram depois das EBULICIONES (inalações, em espanhol), eram provenientes de broncoespasmos resultantes de processos alérgicos.
Ah, o Panamá e os processos alérgicos decorrentes dele. Imagine andar pela rua com um sol de 40 graus na cabeça e o quanto você vai transpirar com isso. Agora, imagine você, com as roupas úmidas de suor e da umidade da Cidade do Panamá, entrando em QUALQUER LUGAR e sendo atingido por uma temperatura repentinamente 20 graus mais baixa, proveniente de um aparelho de ar condicionado. Nem a vovó aconselharia, nem a resistência do corpo do brasileiro aprecia Essa semana eu conheci outro brasileiro na mesma situação, com febre alta e dor de garganta, além da tosse - como eu, durante a semana - , e do meu lado no atendimento do hospital Punta Pacífica havia também um grupo de brasileiros de Salvador acompanhando uma moça com, adivinhe, problemas respiratórios. O lance aqui é que, ao contrário de nós, eles não sacaram que havia brasileiros ao lado, e ficaram falando várias coisas engraçadas, tipo que sei lá quem tinha diarreia, e que não sei quem apanhava do marido (isso não é realmente engraçado, mas na hora foi inusitado).
Ok, processos médicos resolvidos e muito mais calma (não sou hipondríaca, só prevenida - quase morri de pneumonia há um ano), saí do Punta Pacífica com o xale nas costas pra evitar o choque térmico da sauna que estava lá fora e fui, com meu pai e irmão, comer umas empanadas argentinas no Caminito (é o nome do restaurante). No caminho, entre amostras do trânsito panamenho, que é como o paulista, mas com carros com o dobro do tamanho - os SUVs - e uma inteligência de tráfego portuguesa, conhecemos o flanelinha que salvou o dia.
Como aqueles que nós paulistanos conhecemos bem, chegou quase jogando a garrafa de detergente e água - ou seja lá o que realmente haja naquela mistura - no vidro, sem nem perguntar, rodinho na outra mão. Logo ouviu um ‘NÃO’ sonoro do meu pai, em português mesmo. Insistiu no gesto mas se deteve na lavagem: mesmo sob os NÃOs, o que ele fez foi desenhar um coração no vidro com o rodinho. Tipo ‘VIM EM MISSÃO DE PAZ’. Amolecido, meu pai ouviu o que ele tinha a dizer - “DÁ-ME UNA OPORTUNIDAD” -, disse a ele ‘és muy bueno’, deu-lhe uns dois dólares (amigo, aqui com dois dólares você compra umas três latas de coca-cola) e saímos, revigorados pelo amor gratuito e pela criatividade do tiozinho flanelinha panamenho.
Mais uma horinha de trânsito LOCO e, em casa, resolvi registrar o momento aqui no El Cangrejo, um bairro parecidinho com a Vila Mariana, mas cheio de estrangeiros. Sabe, porque eu sabia que teria que escrever o post e precisaria ilustrar, e sem a câmera durante o dia, precisava de uma boa imagem panamenha. Esse por do sol eu vejo todos os dias. Aquele era como eu acharia que ele seria no fim do dia, quando acordei puta da vida por estar mais um dia doente, sem aproveitar a viagem. E esse aqui embaixo é como ele terminou de fato.
(Sei que a primeira, lá em cima, não é feia, nem triste. Mas é melancólica, como eu estava quando acordei. A segunda expressa um pouco mais de esperança, e é por isso que ela está no fim do texto. Foram tiradas, as duas, umas 18h30 da tarde, da sacada do 18D, com uma Lumix FZ35, e não viram sinal de Photoshop).
Travel Panama says:
De El Cangrejo a Punta Pacífica: um dia na Cidade do Panamá …: Esse texto foi postado originalmente no 3meia5… http://bit.ly/hrxLdY
Gustavo D says:
Post muito bom, como sempre! To gostando desses posts meio ‘guia turístico’ haha
Aliás, curti o novo layout do blog. (:
Rodrigo says:
Véio… alguns posts internacionais depois, agora é que me caiu a ficha que você está MORANDO NO PANAMÁ! QUE LOUCURA!
Achei que fosse simplesmente uma viagem acompanhada de uma série de posts guia turístico (como foi dito acima)… ainda não to acreditando que exista esse conceito de “mudar-se para o Panamá”
Eduardo Marques says:
Perdão, acho que entrei no blog errado.
Ana Freitas says:
Isso foi um elogio ou uma crítica?
Andréia says:
Tá lindo, pronto falei.
Marianne Pinheiro says:
Tô até me sentindo agora… tem mais gente nesse mundo que conhece o Panamá! yes! hahaha
Eduardo Marques says:
Isso foi um elogio ou uma crítica?
Nenhum, só uma brincadeira com o novo visual do blog. ;p
Aliás, eu não consegui responder ali. Tem alguma coisa errada com a caixa de comentários na hora de dar um reply.
Karine says:
Gostei do visual novo!
Eu faço parte da população que nem se ligava da existência do Panamá hehehe