10.03

2009
4:49 am

O que é realmente necessário para representar o povo?

Postado em Brasil, Crônicas, Internet, Política, TV, jornalismo

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Conhecimentos gerais. É isso que o CQC está checando no mais recente quadro deles, protagonizado pelo conterrâneo Danilo Gentili, que nesta segunda perguntou a parlamentares coisas que são exigidas em provas simples de admissão de estagiário de jornalismo nos lugares mais fuleiros, como ‘o que é a Jihad’, ‘o que é a Convenção de Genebra’ e ‘onde fica Guantánamo’. E alguns parlamentares não faziam idéia das respostas.

O Gravataí argumentou comigo que ele não considera esse tipo de conhecimento superficial necessário para ocupar esse tipo de cargo público. E eu até concordo com ele, mas veja bem - se você não sabe o que é Jihad, isso não significa apenas que você não sabe o que quer dizer uma palavra. Significa que existe todo um conhecimento geral, mesmo que não-aprofundado, sobre geopolítica, incluindo por exemplo acontecimentos recentes, como o ataque das torres gêmeas, que você não sabe dizer porque aconteceram. Porque se você tivesse lido um pouquinho sobre isso certamente teria se deparado aqui e ali com a palavra e saberia.

Ou seja, o que estou questionando é no que implica você não saber o que é a Jihad, onde fica Guantánamo ou o que é a Convenção de Genebra. Implica, por exemplo, em você ter lido muito pouco ou quase nada sobre conflitos armados recentes, porque os três termos curiosamente se relacionam a guerras. E isso, na minha opinião, te faz inapto a me representar em Brasília. Porque exigem de mim conhecimentos muito mais avançados para ocupar cargos de responsabilidade, salário e regalias muito, muito menores. E porque o mínimo que eu quero é que meus representantes saibam o que está acontecendo no mundo e porquê, mesmo que não for de forma aprofundada.

Eu sei que é uma posição polêmica, mas não acho que pra governar seja mandatório que o cara seja um acadêmico das mais altas qualificações. Acho que sim, ajuda muito se ele for, mas no quesito ‘conteúdo’ considero importante mesmo uma vasta cultura geral, que possibilite ao cara falar sobre tudo e ter uma visão ampla das coisas, bastante leitura, essas coisas. Mas não sou partidária dos literatos ocupando as cadeiras do poder.

conselhos-a-infancia

Tem aquele adorável discurso reacionário da classe média (ilustrado acima), que a gente costuma escutar da molecada mais não politizada que repete o que dizem os pais. Ele diz mais ou menos o seguinte: “como meu filho vai se sentir estimulado a estudar se o presidente só tem até o Ensino Médio?”

A resposta correta a essa pergunta provavelmente inclui algo como “basta não ter um pai como você”, mas isso é extremamente ofensivo. Então a gente só dá uma risadinha, ou finge que tá tudo ok. Mas o pai que aceitar do filho o argumento de que ele ‘não vai estudar’ porque ‘o presidente não estudou’ deve ser mais burro que o presidente.

O presidente não estudou mesmo, até onde sabemos. O Gravataí (de novo) me informou, inclusive, que ele já chegou a dizer que só leu um livro na vida (“A semente da vitória”, de Nuno Cobra), mas não achei fonte no Google pra essa info, tirando que o Lula cita muito o cara nos discursos. Eu não acho, contudo, que isso o torna menos capaz de exercer o cargo que ele exerce. Acho fundamental, contudo, que o presidente tenha conhecimentos gerais básicos - história, geografia, economia, ciências. O suficiente pra ler o jornal do dia e entender o que está acontecendo ali, o que está por trás daquilo. E eu, sinceramente, acho difícil ele ter chegado ali sem saber isso. É um voto meu, e posso estar enganada; mas acho realmente difícil.

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Habilidades musicais do presidente

De qualquer forma, o quadro me desanimou horrores. Me desanimou de ser cidadã, de ser jornalista, de ser estudante, de votar na próxima eleição. Sério - até desliguei a TV depois do quadro. O Arlindo Chinaglia ficou durante 20 segundos enrolando porque não sabia definir Jihad. Ele nem precisava explicar, sabe? Se ele dissesse ‘é a guerra santa islâmica’, tinha matado. Outro cara, do PMDB (não me pergunte nomes), versou durante um minuto sobre Genebra “e sua ‘sede’, a Suíça (sic)”, dizendo que a Convenção era um tratado muito importante assinado por todos os países que definia assuntos muito importantes a respeito do mundo. Assim que rolar um vídeo, eu coloco aqui e você sofre comigo.

Mas a verdade é que os nossos políticos não passam de um reflexo de nós mesmos. E se algumas dessas pessoas chegaram onde chegaram sem conhecimentos que eu considero tão básicos, a culpa é nossa.

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Inteligência corporal? É com Luiz Inácio!

Não tô pedindo muito. Queria só o básico, sério. O básico. Quem lê o jornal pro Lula não é ele, é o Franklin Martins e outros assessores, segundo entrevista que ele deu pra piauí nos últimos meses. Mas o que eu espero do presidente (e de quem me representa além dele nas instituições do país) é que ele saiba contextualizar o que o Franklin diz sem precisar perguntar “Mas ô companhêro, quem é esse Kremlin? É daquele filme da sessão da tarde?”


*Esse texto foi ilustrado com imagens do genial LulaLOL, que… que você só vai entender depois que entrar. A essa altura todo mundo já conhece, mas reza a lenda que eu tenho um público muito particular que não é antenado nessas coisas de internet então me sinto responsável por informá-los das boas coisas da rede.

*Resultado da promoção na terça à noite, sem falta - dando uma de Lúcio Ribeiro.

* Lúcio Ribeiro ainda existe?

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12 comentários (Comente! Trackback)

  1. Fernando Garcia
    10/03/09 | 5:38 am | #

    Eu infelizmente (ou felizmente, sei lá), ainda não vi esse quadro do CQC, mas, pelo amor de deus, É UM ABSURDO pessoas que NO MÍNIMO deveriam saber o que acontece no nosso país e no mundo pra poderem tomar suas decisões, não saberem de coisas tao básicas.

    Estou sem palavras pra tanta incompetencia.

    Responder

  1. chico barney
    10/03/09 | 6:05 am | #

    Ana, acho que não é nem uma opinião polêmica, mas inocente.

    Vai ver a quantidade de gente no país que sabe sobre qualquer um dos termos citados no programa.

    Não é esse o conceito de representatividade?

    Estamos muito bem representados em Brasília. E esse é o problema.

    ABS

    Responder

    Guilherme Atencio Reply:

    Concordo com o Chico Barney. No Brasil a democracia funciona, bem demais até.

    Responder

    Ana Freitas Reply:

    Parece até que foi ingenuidade, mas a conclusão é mesmo meio óbvia e eu não consegui chegar nela. Embora tenha pensado numa parada da qual minha mãe tentou me convencer uma vez, que essa ignorância dos políticos se alimenta, porque é reflexo da ignorância do povo, que acaba tendo maus exemplos na política em assim segue…

    Mas sei lá. A parada toda me deixou bem pra baixo, uma puta besteira, mas deixou.

    Responder

  1. Saulo
    10/03/09 | 1:21 pm | #

    Acho que podemos ver toda a situação por um outro ângulo.

    Devemos pensar que a geração que agora ocupa os altos escalões da política não sofreu o mesmo nível de exigências as quais a grande maioria dos jovens de hoje são submetidos.

    Se pararmos para pensar, o fato de que seja exigido que você e qualquer jovem tenha o mínimo de conhecimentos gerais para conseguir uma vaga de emprego gera perspectivas otimistas.

    Se projetarmos as exigências de hoje para o futuro, podemos pensar que a próxima geração de políticos terá uma noção maior dos problemas da realidade, uma vez que isso lhes foi cobrado pela sociedade quando ainda eram estudantes.

    Quanto ao Lula, não acho que o país precise de um presidente com alto nível de escolaridade. Mas acho que o país necessita de um presidente inteligente, que saiba lidar com os problemas do país com flexibilidade e noção do que está acontecendo. A grande questão não é se o Lula terminou sua educação, mas sim se ele é inteligente.

    Particularmente, mantenho uma visão preconceituosa sobre o assunto. Visão essa nutrida pelo meu nicho social. Acredito que uma pessoa que não consegue ler o próprio jornal não pode ser muito inteligente. Aqui mesmo, uns posts atrás, foi feita a relação entre mau gosto e inteligência. Seguindo esses esteriótipos, podemos afirmar que o presidente não passa uma imagem de QI elevado.

    Certamente toda minha argumentação é quebrada com o argumento: “Como você pode dizer que um homem que não terminou o ginásio e conseguiu ser eleito presidente não é inteligente?”

    Prefiro não manter uma opinião formada sobre o assunto. Afinal, foi o voto popular que elegeu nosso presidente, e eu respeito a democracia.

    Responder

  1. Fabio Bittar
    10/03/09 | 2:21 pm | #

    Cara, vou ser sincero… sou a favor da obrigatoriedade de ensino superior para presidente e senador; ensino médio é aceitável no caso de deputados e vereadores já que estes, em tese, representam as imediações em que foram eleitos (seus respectivos currais eleitorais) e por isso mesmo deveriam ser poupados de requerimentos acadêmicos que talvez sejam inexistentes em localidades empobrecidas. Prefeito e Governador, nível médio também pode.

    E o essencial: exames de “admissão política e eleitoral”. Se o sujeito é uma porta, mesmo com seu diploma (comprado) em economia, não pode representar a mim ou a qualquer um, sejá em Etérnia (Brasília para os íntimos) ou no gabinete oficial do município da Puta-que-o-pariu, no Acre.

    Voto obrigatório é outra sacanagem à brasileira.

    Responder

  1. Joaquim Basso
    10/03/09 | 9:34 pm | #

    Ana, eu me pergunto: será que você não acha essencial aquele tipo de conhecimento, porque você o tem? Quero dizer, como jornalista (se não me engano, é isso que você é), você presume que as pessoas saibam e acompanhem as notícias do mundo.
    Eu, como advogado, acho imprescindível que os parlamentares saibam o que é a Constituição, o que são as leis, e tenham uma noção de Direito, porque, afinal, são eles que, em parte, o criam.
    Fico imaginando o que os médicos acham que nossos parlamentares deveriam saber. E os engenheiros? E economistas? E matemáticos, físicos, biólogos, ambientalistas de todo tipo? Agrônomos, veterinários, zootecnistas? Enfim… Se todos tivessem que saber tudo aquilo que todos acham que devem, nossos deputados e senadores teriam de ser verdadeiras máquinas.
    Acho que não é necessário saber tudo isso. Na função deles, o que eles precisam é saber como buscar o conhecimento adequado e preciso, já que saber tudo é impossível.
    Isso, com certeza, não é testado por uma entrevista entravada de supetão no meio da rua. Eu sugeriria que dessem, por exemplo, 5 minutos para o parlamentar responder a pergunta. Se, nesse tempo, ele não conseguisse a rede de informação necessária para dar uma aula sobre o assunto, aí sim, teríamos um político incapaz.

    Responder

  1. Luciano
    11/03/09 | 3:00 am | #

    Eu tenho aqui em casa um livro só de entrevistas com o Lula…lançado em 88…o cara é inteligente pra caralho, sabe tudo sobre o mundo e tal…isso em 88 ainda…mais inteligente que 90% da metô, incluindo professores.

    Agora, quanto a deputados…não acho que todos precisem responder essas perguntas, mesmo. Mais complicado ainda pra deputados ligados mais ao povão, a estados afastados dos pólos econômicos e tal…Mas pra um cara como o Chinaglia é bem vergonhoso sim…

    Responder

  1. Stephen Dedalus
    12/03/09 | 6:47 pm | #

    Alguém sabe, por acaso, se nível de conhecimento elevado é sinônimo de “bom-mocismo”? Por exemplo, imaginemos um sujeito com muito conhecimento - que fala várias línguas, e sabe coisas prá caramba. Esse sujeito seria ou não capaz de criar esquemas, para, por exemplo, comprar parlamentares, aprovar emendas que o favoreceriam (para inventar uma reeleição, por exemplo) e coisas do tipo? Ah, é, eu ia me esquecendo: isso já aconteceu (http://pt.wikipedia.org/wiki/Governo_Fernando_Henrique_Cardoso#A_emenda_da_reelei.C3.A7.C3.A3o)…

    Responder

  1. Yuri
    14/03/09 | 1:34 am | #

    A habilidade necessária à um político é reunir um grupo em torno de si, capaz de responder às necessidades que irão surgir.

    Tem gente que tem essa habilidade e usa pra montar esquemões de ladroagem.

    Tem gente que tem essa habilidade e usa para conduzir uma cidade, país, ou estado.

    Tem gente que tem e usa pros dois.

    Tem gente que tem isso e, no entanto, prefere ser garçom e é.

    Diploma não resolve, vide FHC.

    Se tivesse fórmula de governo bom, a gente não tava f…

    E, no mais, bem, veja, se hoje não tem educação pública universal, ao invés de exigir diploma pros candidatos, vamos exigir que melhorem a educação depois de eleitos? (E, óbvio, votar nos que tem capacidade de fazer isso)

    Me parece mais coerente…

    Responder

  1. Lorena Lima
    01/10/09 | 3:05 am | #

    http://bit.ly/OEUSY #Há de se pensar!

  1. Lorena Lima
    01/10/09 | 3:09 am | #

    http://bit.ly/OEUSY #Hádesepensar! Mas Leia tudo

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